A concha

 "A minha casa é concha. Como os bichos,

Segreguei-a de mim com paciência:
Fachada de marés, a sonho e lixos;
O horta e os muros – só areia e ausência.

Minha casa sou eu e os meus caprichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal que os santos esboroou nos nichos.

E telhados de vidro, e escadarias
Frágeis, cobertas de hera – oh bronze falso!
Lareira aberta ao vento, as salas frias.

A minha casa... Mas é outra a história:
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória."


Vitorino Nemésio, in 'O Bicho Harmonioso'


Imagem: MB, Arrábida, 20.07.2014



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