Companheiro invisível 🎶

 

"Todos temos um animal que ninguém consegue ver. O meu, displicente, lambe o corpo anelado se o observo lentamente. Também me observa enquanto limpo estas palavras. Por vezes cabe no meu punho ou palpita nos recantos; caminho frequentemente coberto pela sua capa. Geralmente vai a meu lado e, nas horas de alegria, com o seu bico cintilante abre o horizonte em dois. Surge deitado ao sol quando me dedico a trabalhos injustos. Nunca demonstra êxtase ou decepções; exibe a indiferença altiva de um juiz que nem condena os meus erros, mas ajuda-me a inventar estremecimentos. Imprevisível, abandona-me nos dias de dor. Não regressa durante várias horas, fugindo para sítios que desconheço mas que imagino remotos. Suponho que aí se junta a outros da mesma espécie. Vejo-o afastar-se e penso: pobre animal, move-se como um saco cheio de infância e tempo parado. O nosso medo chama-lhe alma."

Francisco Javier Irazoki, in Animal Aberto, Edição Medula

Imagem: MB, Moita, 28.05.2023







 

 


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