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A mostrar mensagens de setembro, 2021

Sentar-me um instante...

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  " Quero Nos teus quartos forrados de luar Onde nenhum dos meus gestos faz barulho Voltar. E sentar-me um instante Na beira da janela contra os astros E olhando para dentro contemplar-te, Tu dormindo antes de jamais teres acordado, Tu como um rio adormecido e doce Seguindo a voz do vento e a voz do mar Subindo as escadas que sobem pelo ar." Sophia de Mello Breyner Andresen Imagem: MB, Moita, 05.09.2021

Espero...

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  Espero a tua vinda a tua vinda, em dia de lua cheia. Debruço-me sobre a noite a ver a lua a crescer, a crescer... Espero o momento da chegada com os cansaços e os ardores de todas as chegadas... Rasgarás nuvens de ruas densas, Alagarás vielas de bêbados transformadores. Saltarás ribeiros, mares, relevos... - A tua alma não morre aos medos e às sombras!- Mas..., Enquanto deixo a janela aberta para entrares, o mar, aí além, sempre duvidoso, desenha interrogações na areia molhada... Fernando Namora , in Relevos Imagem: MB, Moita, 22.09.2021

No teu poema (letra, imagem e música)

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  No teu poema Existe um verso em branco e sem medida Um corpo que respira, um céu aberto Janela debruçada para a vida No teu poema existe a dor calada lá no fundo O passo da coragem em casa escura E, aberta, uma varanda para o mundo. Existe a noite O riso e a voz refeita à luz do dia A festa da Senhora da Agonia E o cansaço Do corpo que adormece em cama fria. Existe um rio A sina de quem nasce fraco ou forte O risco, a raiva e a luta de quem cai Ou que resiste Que vence ou adormece antes da morte. No teu poema Existe o grito e o eco da metralha A dor que sei de cor mas não recito E os sonos inquietos de quem falha. No teu poema Existe um cantochão alentejano A rua e o pregão de uma varina E um barco assoprado a todo o pano Existe um rio O canto em vozes juntas, vozes certas Canção de uma só letra E um só destino a embarcar No cais da nova nau das descobertas Existe um rio A sina de quem nasce fraco ou forte O risco, a raiva e a luta de quem cai Ou que resiste Que vence ou adormece ant

Há muito tempo...

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  Há muito tempo, sim, não te escrevo. Ficaram velhas todas as notícias. Eu mesmo envelheci. Olha, em relevo, estes sinais em mim, não das carícias (tão leves) que fazias no meu rosto: são golpes, são espinhos, são lembranças da vida a teu caminho, que ao sol-posto perde a sabedoria das crianças. A falta que me fazes não é tanto à hora de dormir, quando dizias: "Deus te abençoe", e a noite abria em sonho. É quando, ao despertar, revejo a um canto a noite acumulada de meus dias, e sinto que estou vivo, e que não sonho. Carlos Drummond de Andrade , Lição de Coisas Imagem: MB, Moita, 12.09.2021

Amar o perdido

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  Amar o perdido deixa confundido este coração. Nada pode o olvido contra o sem sentido apelo do Não. As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão. Mas as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão. Carlos Drummond de Andrade , em Amar-Amaro Imagem: MB, Moita, 05.09.2021

Chegada do outono

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  Não percebi a chegada do outono. Mas eu sentia que estava embarcando numa nova estação: todas as árvores que (não) plantei, de repente, estavam nuas. E eu caminhava num tapete de folhas e flores. Os caminhos também se estreitaram e tive uma sucessão de perdas, ou melhor, tive uma sucessão de trocas. E assim, como toda pessoa que tem um coração pulsando, fiquei assustada demais com as mudanças. Mas agora já consigo perceber beleza na nudez de cada uma das minhas árvores prediletas. Elas apenas estão trocando de roupa enquanto eu troco de pele, tamanha cumplicidade. Marla de Queiroz Imagem: MB, Moita, 22.08.2021

Fachada

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  "Em todas as almas, como em todas as casas, além da fachada, há um interior escondido." José Saramago Imagem: MB, Moita, 12.09.2021

Devagar...

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  Devagar te amo, e devagar assomo os dedos à altura dos olhos, do cabelo dos anéis de outro turno, que é só meu por querê-lo, meu amor, como a ti mesma quero nos tempos de passado e sem futuro. Devagar avanço um dealbar de dias que vida seriam - mesmo que morto, à noite, eu voltasse amargurado mas presente, calado e quedo, e devagar amando. Pedro Tamen ,  Rua de Nenhures Imagem: MB, Moita, 12.09.2021

Aniversário

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  Ama-me, agora, antes que a palavra chegue. Toca-me antes que haja mundo, Beija-me antes que comece o beijo. Despe-me para que eu esqueça ter corpo. Devolve-me  o reino onde fui deus. Ama-me até não sermos dois. Ama-me. E tudo será depois. Mia Couto , in  Vagas e Lumes , edição Caminho Imagem: MB, 22.09.2021