A chave das coisas

 O que significa o rio,

a pedra, os lábios da terra
que murmuram, de manhã,
o acordar da respiração?
O que significa a medida
das margens, a cor que
desaparece das folhas no
lodo de um charco?
O dourado dos ramos na
estação seca, as gotas
de água na ponta dos
cabelos, os muros de hera?
A linha envolve os objectos
com a nitidez abstracta
dos dedos; traça o sentido
que a memória não guardou;
e um fio de versos e verbos
canta, no fundo do pátio,
no coro de arbustos que
o vento confunde com crianças.
A chave das coisas está
no equívoco da idade,
na sombria abóbada dos meses,
no rosto cego das nuvens.

Nuno Júdice, Meditação sobre Ruínas

Imagem: MB, Guia, agosto 2020




Comentários

Mensagens populares deste blogue

No princípio

Feliz Natal de 2023 e um um Ano novo de 2024 repleto de sentimentos bons...