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A mostrar mensagens de outubro, 2020

Canção de outono

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  No entardecer da terra, O sopro do longo outono Amareleceu o chão. Um vago vento erra, Como um sonho mau num sono, Na lívida solidão. Soergue as folhas, e pousa As folhas volve e revolve Esvai-se ainda outra vez. Mas a folha não repousa E o vento lívido volve E expira na lividez. Eu já não sou quem era; O que eu sonhei, morri-o; E mesmo o que hoje sou Amanhã direi: quem dera Volver a sê-lo! mais frio. O vento vago voltou. Fernando Pessoa , Ilustração Portuguesa, n° 833 Imagem: MB, Moita, 18.10.2020

Eu sou o sítio....

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  Missão Impossível VI eu sou o sítio onde as marés ainda não decidiram para que lado vão arrastar o mundo Sónia Balacó, CONSTELAÇÃO, edição Mariposa Azual Imagem: MB, Gaio-Moita, 23.10.2020 

The eye

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  T he eye sees only what the mind is prepared to comprehend. -Henri Bergson Imagem: MB, Moita, 11-10-2020 

O teu nome...

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  Devo dizer O teu nome é que está certo. Rezo-o, em silêncio, mexendo os lábios; pareço bêbedo, ou louco, por fora, por dentro, vai um início duradouro, promessas cumprem-se de letra em letra, velas acendem velas que acendem velas como ondas que passem para nenhuma praia. E o meu, impróprio, a errar em toda a parte os seus calos e feridas indecifráveis, cura-se, descansa, restaura-se no teu, dizendo-o, bebendo-o, vertendo-o em grandes doses pela pele do ouvido abaixo. João Paulo Esteves da Silva Imagem: MB, Moita, 04-10-2020  

Ítaca

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  O ser amado não precisa viver. O ser amado vive na cabeça. O tear é para os pretendentes, suspenso como uma harpa de brancos filamentos. Ele era duas pessoas. Era corpo e voz, o fácil magnetismo de um homem vivo, e então o sonho revelado ou a imagem formada pela mulher manejando o tear, ali sentada num salão cheio de homens de mentes literais. Se te causa pena o mar enganado que tentou levá-lo para sempre e devolveu apenas o primeiro, o verdadeiro marido, deverias sentir pena desses homens: eles não sabem para o que estão olhando; eles não sabem que quando alguém ama dessa maneira o manto se torna um vestido de casamento Louise Glück Imagem: MB, Moita, 16.10.2020

Gravar a luz ...

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  Na noite de todos os tempos, eu queria gravar a luz do teu rosto.   Alberto de Lacerda , dezembro de 1953, LABAREDA, edição Tinta da China. Imagem: MB, 14.10.2020 

O poema

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  Cada um lê no poema o poema que traz em si. André Tecedeiro, A AXILA DE EGON SCHIELE, edição Porto Editora Imagem: MB, Moita - Gaio, 23.10.2020

Privilegiado

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  " Sou um privilegiado neste mundo, sou dos poucos que empreendeu essa outra viagem. E não foi no mar que viajei, foi em ti que cruzei fronteiras que me separavam de mim mesmo." Mia Couto, "O Bebedor de Horizontes" Imagem: MB, Moita, 29.09.2020

O Amor Não tem Nenhuma Parte Terrena

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  O Amor não Tem Nenhuma Parte Terrena Diz que o seu amor não tem nenhuma parte terrena. Por ser maior o cerco de ouro ardente do sol que o globo opaco que é a terra, e menor que este o que à lua encerra as três caras que mostra diferente, ora a vemos minguante, ora crescente, ora na sombra o eclipse a enterra; porém aos seis planetas não faz guerra, nem uma estrela sua injúria sente. A fogueira do meu amor, cravada no zénite do vasto firmamento, não baixa em sombras ou está eclipsada. Manchas da terra não as experimento: que sua noite dista da sagrada região onde minha fé tem seu assento,   Francisco Quevedo , Antologia Poética (Tradução de José Bento) Imagem: MB, Moita, 13.09.2020 

Os gatos

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  Há um deus único e secreto em cada gato inconcreto governando um mundo efémero onde estamos de passagem   Um deus que nos hospeda nos seus vastos aposentos de nervos, ausências, pressentimentos, e de longe nos observa   Somos intrusos, bárbaros amigáveis, e compassivo o deus permite que o sirvamos e a ilusão de que o tocamos   Manuel António Pina , Os gatos, Como se desenha uma casa. Lisboa: Assírio & Alvim Imagem: MB, Éfeso, Turquia, 2015

Receita

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  essa é a receita da vida minha mãe disse me abraçando enquanto eu chorava pense nas flores que você planta a cada ano no jardim elas nos ensinam que as pessoas também murcham caem criam raíz crescem para florescer no final! Rupi Kaur , in Leite e Mel Imagem: MB, 11.10.2020, Moita

Nada mais resta que um outubro...

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  De amor nada mais resta que um Outubro e quanto mais amada mais desisto: quanto mais tu me despes mais me cubro e quanto mais me escondo mais me avisto. E sei que mais te enleio e te deslumbro porque se mais me ofusco mais existo. Por dentro me ilumino, sol oculto, por fora te ajoelho, corpo místico. Não me acordes. Estou morta na quermesse dos teus beijos. Etérea, a minha espécie nem teus zelos amantes a demovem. Mas quanto mais em nuvem me desfaço mais de terra e de fogo é o abraço com que na carne queres reter-me jovem. Natália Correia , Poesia Completa Imagem: MB, Moita 09.10.2020

Na mão...

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  Na mão, em dedos leves Na mão, em dedos leves e suspensos, Sentir o fluido peso que se esquiva. Ou, com dedos recurvos que se tocam, Cingir musculaturas delicadas. Ou, prolongando em dedos a mão toda, Medir quanto de carne ali se amplia. A mão conhece o que mal os olhos vêem Jorge de Sena Imagem: MB, 04.10.2020