Nus
Nus nascemos, nus
nos inspecciona o médico,
a tropa, o professor de ginástica.
Nus, na mesa de operações,
na cama de hospital,
na da morte.
Nus no amor para nos vermos,
sentirmos a pele dos outros corpos e
para mais que penetrarmos
termos o choque e o roçar
que nos dizem do quanto penetramos.
Nus sempre, menos no que não importa.
Porque há então quem tema tanto
a nudez dos outros? Será
que teme, menos que o feio
de muitos, a beleza de
alguns, ou o fascínio das
esplêndidas partes
de uns raros? E que, paralisados
(de inveja), deixemos que o mundo e a vida
se soltem à deriva
para a nua liberdade?
Jorge de Sena, in Peregrinatio ad Loca Infecta - Poesia III
Imagem: MB, Moita, 24.01.2021
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